sábado, 2 de maio de 2009

O processo


"Alguém devia estar caluniando Joseph K., pois sem ter feito nada errado ele foi preso em uma manhã."


O erro capital de Joseph K. - através do qual Kafka quer provar a tendência humana a submissão a qualquer forma de autoridade -, é a aceitação que ele tem do processo. Em nenhum momento do romance, nem personagem, nem leitor, ficam sabendo de quê K. está sendo acusado, e assim, entramos nós mesmos em uma espécie de submissão passiva tão forte, que ao longo das páginas esse detalhe que deveria ser ultrajante perde importância e esmaece.


Depois vem a incapacidade que Joseph demonstra de seguir as regras do jogo do tribunal. Ele sucumbe ao ambiente opressivo e unilateral, do qual nada se sabe, onde toda informação é sumáriamente destruída de tal forma que nem os advogados têm acesso aos autos e precisam elaborar as defesas às cegas. Ainda assim, K. dispensa seu advogado e todas as ajudas oferecidas por outros figurantes do tribunal, e assume a causa para si mesmo, em mais uma tentativa inútil de lidar com este estado de "preso em liberdade".


Esses erros provam-se fatais quando Joseph K. é executado no final do livro. O que acontece com o personagem entre o penúltimo capítulo - quando na catedral K. ainda está lutando para livrar-se do processo - e a entrega não-relutante à execução, fica em aberto. Terá K. desistido de vez e submetido-se a autoridade ou trata-se de um derradeiro ato de livre-escolha, para escapar completamente ao sistema?


Como o personagem Gregor Samsa, de A metamorfose, em O processo, Kafka expõe seu protagonista a situação em que ou sucumbe às circunstâncias terríveis ou tenta construir um outro ambiente a seu redor. E Joseph, como Gregor, está mais disposto a retomar o controle de sua vida, mas a sua recusa a aceitar as regras e os habitantes de seu novo mundo o levam ao isolamento total e culminam na única saída possível.

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